Bem de família pode ser penhorado pelo não pagamento das despesas de condomínio

O mercado imobiliário brasileiro está aquecido. Inúmeras construtoras estão sendo criadas, ao passo que outras já consolidadas no mercado estão se expandindo para regiões outrora carentes e inclusive outros países. Não obstante, o crédito imobiliário está mais acessível à população ao passo que as várias opções de financiamento voltadas para os diferentes tipos de imóveis tornam o sonho da aquisição da casa própria uma realidade latente no país.

Construções residenciais se espalham por todos os bairros da cidade e as opções de compra são variadas a depender da classe do comprador, que poderá adquirir seu imóvel num condomínio de casas térreas ou uma unidade habitacional num prédio de apartamentos, por exemplo.

Apesar das facilidades do financiamento imobiliário, há quem prefira o aluguel por várias razões, seja porque ficará num local por tempo determinado e não definitivo, ou ainda porque intenta juntar recursos para adquirir seu imóvel próprio sem financiamento, enfim, somente a pessoa poderá saber qual a melhor opção a ser tomada.

A escolha da moradia num condomínio de edificações residenciais é uma decisão que deve ser conscientemente tomada pelo proprietário ou locatário porque, além da sua unidade privativa, existem áreas comuns compartilhadas por todos os condôminos.

Não se pode negar que há vantagens em morar no condomínio, quer seja pela segurança, quer seja pela área de lazer, enfim algumas vantagens que talvez não fosse possível tê-las caso residisse uma casa autônoma. Por outro lado, deve ter plena consciência que o respeito ao semelhante é uma regra básica dos condomínios, mormente porque desfrutará de locais comuns a todos os moradores.

Entretanto, não se pode olvidar que para desfrutar destas comodidades o morador de um condomínio edilício deve incluir nos seus gastos mensais mais uma despesa, qual seja, a taxa de condomínio.

Diz o artigo 1.336 do Código Civil:

“São deveres do condômino:

I – contribuir para as despesas do condomínio na proporção das suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção;(…)”

Conforme previsto na lei civil, é obrigação do condômino pagar a taxa de condomínio, sob pena de serem tomadas medidas para o recebimento da mesma.

A primeira medida advém do próprio condomínio ao estipular sanções no caso de inadimplência, nos termos do § 1º do artigo 1.336 do Código Civil: § 1o – O condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, os de um por cento ao mês e multa de até dois por cento sobre o débito.

Assim, caso haja atraso no pagamento da taxa condominial, serão devidos juros moratórios e multa. Neste caso houve o pagamento, porém tardio, e por consequência incidiu juros e multa.

Situação diversa ocorre quando o condomínio necessita ingressar em juízo para receber a taxa de condomínio.

Se a demanda for favorável ao condomínio, além dos juros e multa, poderá ocorrer ainda a condenação do devedor no pagamento dos honorários advocatícios e das custas processuais. Obviamente ao devedor, réu na ação, durante a tramitação da demanda judicial lhe é dada a garantia constitucional da ampla defesa e do contraditório.

Julgada procedente a ação e o condômino devedor efetuar o pagamento integral da dívida da qual fora condenado, o processo será extinto e arquivado.

Entretanto, há inúmeros casos em que o devedor não cumpre com a obrigação que fora condenado, deixando transcorrer o prazo para o pagamento sem se manifestar a respeito, cabendo então ao condomínio dar prosseguimento na ação.

Para garantir seu crédito no cumprimento da sentença, o autor (condomínio) poderá pedir ao juízo a penhora de bens do devedor.

Nos termos do artigo 655 do Código de Processo Civil, há uma ordem de preferência na penhora. Vejamos:

“Art. 655. A penhora observará, preferencialmente, a seguinte ordem:

I – dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira;

II – veículos de via terrestre;

III – bens móveis em geral;

IV – bens imóveis;

V – navios e aeronaves;

VI – ações e quotas de sociedades empresárias;

VII – percentual do faturamento de empresa devedora;

VIII – pedras e metais preciosos;

IX – títulos da dívida pública da União, Estados e Distrito Federal com cotação em mercado;

X – títulos e valores mobiliários com cotação em mercado;

XI – outros direitos.”

Assim, os bens imóveis constam no rol apresentado pelo artigo 655 do CPC e podem ser penhorados pelo juízo para garantir o pagamento da dívida condominial. Eis aqui o cerne da questão.

Nas dívidas de condomínio a própria unidade privativa, ou seja, o apartamento em si, poderá ser penhorado, ir a hasta pública e arrematado por terceiros, mesmo que este seja o único imóvel do devedor.

Há no direito brasileiro o instituto jurídico do “bem de família”. A Lei 8.009/90 que dispõe sobre a impenhorabilidade deste bem assenta no artigo o seguinte:“O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei”. O artigo 5º conceitua residência: “para os efeitos de impenhorabilidade, de que trata esta lei, considera-se residência um único imóvel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente”.

Ocorre que o artigo 3º da lei traz um rol de exceções onde a penhora deste único bem imóvel é permitida.

“Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:

I – em razão dos créditos de trabalhadores da própria residência e das respectivas contribuições previdenciárias;

II – pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato;

III – pelo credor de pensão alimentícia;

IV – para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar;

V – para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar;

VI – por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens.

VII – por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.”

O Supremo Tribunal Federal, no Recurso Extraordinário 439.003/SP, Relator Ministro Eros Grau, já se posicionou acerca do tema. Vejamos:

“EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. BEM DE FAMÍLIA. PENHORA. DECORRÊNCIA DE DESPESAS CONDOMINIAIS.

1. A relação condominial é, tipicamente, relação de comunhão de escopo. O pagamento da contribuição condominial [obrigação propter rem] é essencial à conservação da propriedade, vale dizer, à garantia da subsistência individual e familiar – a dignidade da pessoa humana. 2. Não há razão para, no caso, cogitar-se de impenhorabilidade. 3. Recurso extraordinário a que se nega provimento.”

O artigo 1.715 do Código Civil Brasileiro, no mesmo sentido, dispõe: “o bem de família é isento de execução por dívidas posteriores à sua instituição, salvo as que provierem de tributos relativos ao prédio, ou de despesas de condomínio”.

Veja que o artigo acima é claro ao excepcionar a regra da isenção do bem de família acerca das execuções por dívidas, na medida em que claramente estabelece que nas despesas de condomínio o bem imóvel objeto desta dívida poderá sofrer as consequências da execução e posterior perda deste bem.

Portanto, aquela noção de que o único bem imóvel não pode sofrer constrição judicial para pagamento de dívidas não é uma regra absoluta, comportando, portanto, exceções.

Os artigos acima demonstram cabalmente que a regra da impenhorabilidade do único bem imóvel sofre exceções em várias situações distintas, como por exemplo, para garantir dívidas trabalhistas de empregados da residência; pagamentos de pensão alimentícia; fiadores em contratos de locação; cobranças de IPTU; taxas devidas em função do imóvel, no caso as taxas de condomínio, dentre outras.

Portanto, aos devedores que se escondem atrás de falsas percepções de que seu único imóvel não servirá de garantia para saldar obrigações descumpridas, a depender da dívida, cairá nas exceções apontadas pela lei e o seu bem poderá ser penhorado e arrematado para o pagamento do débito com o condomínio.

Merece aplauso a lei que excepciona a regra da impenhorabilidade do único bem familiar e garante a penhora do mesmo para o pagamento da dívida condominial porque, se assim não fosse, pairar-se-ia a injustiça sobre os demais condôminos que arcam com suas obrigações mensais. Conforme dito, há vantagens em residir num condomínio e exceções louváveis advindas da lei que intenta afastar devedores desavisados no tocante a sua obrigação mensal de pagar a dívida rateada entre os moradores.

Assim, mesmo que o único bem imóvel seja instituído como bem de família, ao devedor das despesas de condomínio não se aplicam as regras da impenhorabilidade, podendo ele sofrer as consequências da execução judicial e posterior perda do imóvel pela dívida não paga.

Fonte: Âmbito Jurídico 

Bem de família pode ser penhorado pelo não pagamento das despesas de condomínio

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